A Apple frequentemente apela para estratégias agressivas para proteger suas propriedades intelectuais, e garantir o controle absoluto da narrativa sobre seus produtos. Veja, por exemplo, como ninguém, exceto a Disney, foi permitido fotografar ou filmar o headset Vision Pro em uso.
E quando o alvo em questão é algo mais genérico, como maçãs? Cupertino tentando garantir os direitos de imagem sobre a fruta não é bem uma novidade, mas o recente imbróglio pelo uso da iconografia na Suíça reavivou a discussão.
A empreitada da Apple em garantir os direitos de imagem irrestritos sobre o uso da maçã como iconografia data de 2004, quando a gigante apresentou um primeiro registro à Organização Mundial da Propriedade Intelectual (OMPI, ou WIPO em inglês).
A documentação consistia em uma foto genérica, em preto-e-branco de uma maçã-verde, para uso da imagem e interpretações derivadas em uma grande gama de produtos e serviços. O registro preliminar foi concedido em 2007 nos Estados Unidos e o definitivo em 2009, e desde então, vem sendo implementado, ou não, em diversos países.
O registro da marca no site da OMPI detalha quais nações aceitaram a aplicação da Apple, e quais o negaram (o compliance não é uniforme); Reino Unido, China, Japão, Turquia e Israel, entre outros, concederam o direito irrestrito à maçã, enquanto Samoa o recusou de forma provisória.
A título de curiosidade, o registro não foi submetido à análise no Brasil, embora o país seja membro da OMPI.
A estratégia de companhias para assegurar direitos intelectuais sobre marcas genéricas é uma prática já bem manjada, e pode-se aplicar a tudo, e é geralmente perseguida por indivíduos ou companhias com grande poder aquisitivo, e azar de quem usa a propriedade em disputa há mais tempo, caso o registro seja concedido.
É o caso da Fruit-Union Suisse, a maior e mais antiga organização (basicamente um sindicato) de produtores de frutas da Suíça. Fundada em 1912, ela usa o logotipo de uma maçã vermelha, com a cruz branca da bandeira do país sobreposta, há várias décadas, e desde antes da fundação da Apple Computer Company, em 1.º de abril de 1976.
A Apple apresentou o registro de direitos sobre a imagem de uma maçã ao Instituto de Propriedades Intelectuais da Suíça em 2017, que concedeu direitos provisórios limitados em 2022, citando que marcas genéricas, como a iconografia de uma fruta, são de domínio público. Cupertino, claro, entrou com uma apelação e de lá para cá, o caso está empacado.
Oficialmente, a situação da marca na Suíça é similar à em Samoa, de uma proibição parcial, mas o caso está tirando o sono dos responsáveis pela Fruit-Union Suisse, pela incerteza do que o futuro reserva. A organização não foi processada (ainda), mas isso pode mudar.
Em entrevista ao site WIRED, Jimmy Mariéthoz, diretor da organização de produtores suíça, disse ser "difícil entender qual é o objetivo da Apple" com o processo, visto que a empresa não está tentando proteger sua logo da maçã mordida.
A intenção é claramente assegurar direitos globais absolutos sobre a imagem da fruta per se, em qualquer formato e interpretação, "algo quase universal, que deveria ser gratuito, para todos usarem".
O caso foi para os tribunais e pode se estender por anos a fio; como a Suíça não é país-membro da União Europeia, onde o registro da Apple não foi submetido, muito provavelmente porque o bloco o ignoraria em prol do domínio público (é possível que o mesmo se aplique ao Brasil), a decisão sobre quem tem direitos pode pender para o lado de quem tem mais dinheiro, como já aconteceu em outros países.
Caso a Apple saia vencedora, a Fruit-Union Suisse seria forçada a mudar sua logo, sob pena de processo por infração de direitos autorais no país, mas por que parar por aí? Excluindo a UE e Brasil, há uma série de países em que a gigante de Palo Alto pode implementar o domínio de sua marca, inclusive em alguns da América Latina onde ela conseguiu o registro, como México, Chile e Colômbia.
Claro, há o "pequeno" empecilho de que a Apple teria que se digladiar com a Igreja Católica, a organização mais antiga e rica do mundo, com 2.000 anos de história e propriedades.
É muito mais simples processar companhias menores, com menor poder aquisitivo e incapazes de assegurar longas e custosas batalhas judiciais, como a Fruit-Union Suisse, fazendo uso da estratégia do gorila de 300 kg, o que não daria certo com a ICAR, basicamente um Leviatã.
Como de praxe, a Apple não comentou o assunto.
Fonte: WIRED
Apple quer direitos de imagem globais sobre... maçãs - Meio Bit
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